Foi por volta de 1976 o batismo do menino flamenguista no grande Maracanã. Meu pai, diligente e atencioso com a paixão do filho, levava-o aos jogos, inicialmente nas cadeiras, mais tarde nas arquibancadas, para que meu irmão visse, ao vivo, seu time jogar.
No primeiro Flamengo e América assistido pelos dois, ainda nas cadeiras, meu irmão, todo paramentado de Flamengo, bandeira e tudo, pediu: “pai, gol do América, você não pula, gol do Flamengo eu não pulo, tá?” Meu pai, imediatamente, rejeitou a ideia, cada um que vibrasse pelo seu time, onde já se viu tamanho disparate?
Início de jogo, meu irmão comia cachorro quente, sorvete, refrigerante, tudo o que faz a alegria de um menino dentro do estádio torcendo por seu time, enquanto meu pai, zeloso, segurava a bandeira do Flamengo. Primeiros minutos, gol do América. Meu pai, com a bandeira do Flamengo nas mãos, levantou e começou a gritar gol, a pular e rir feliz. Dois senhores distintos, sentados nas cadeiras atrás, pensaram se tratar do maior ignorante do futebol: gol do América, o sujeito com a bandeira do Flamengo, pula e grita.
Ainda no primeiro tempo, o Flamengo empatou. Meu pai continuava a segurar a bandeira, ficou sentado, cabisbaixo, enquanto meu irmão pulava enlouquecido. Se os dois senhores tinham alguma dúvida, ali ficara comprovado: o sujeito era uma anta para o futebol. No segundo tempo, Flamengo fez dois a um, virou o jogo e, novamente, quem vibrou foi meu irmão, enquanto meu pai continuava a segurar a bandeira adversária. Fim de jogo, filho flamenguista feliz da vida, pai americano carregando bandeira.
Um pouco mais velhos, os dois voltam ao Maracanã, para outro Flamengo e América, dessa vez, arquibancada, torcida do Flamengo, que meu irmão não fazia por menos. Início do jogo, Flamengo faz um gol, meu pai se vira para falar com o filho e cadê? Meu irmão estava pendurado nos braços de um torcedor flamenguista imenso, um armário três por dois, os dois pulando e rindo de alegria com o time.
Depois disso, foi o tempo do Flamengo vencer qualquer disputa, até chegar ao Mundial de Clubes, e meu irmão, já com doze anos, perdido para sempre em sua imensa paixão rubro-negra, contagiou toda a família e amigos próximos. Certa vez, minha mãe perguntou se o Flamengo jogasse contra a Seleção Brasileira, para quem meu irmão torceria. Ela tem alguma dúvida?
Hoje em dia, meu pai assiste aos jogos e torce pelo Flamengo, apesar de negar veementemente, junto com o filho, agora pai de outro flamenguista de onze anos. Três gerações unidas por uma paixão: o futebol. Ou seria o Flamengo?