Shee anda exausta dos últimos dois meses. Como todos nós, ainda espera a chegada de quem não chega, a volta de quem chamava ela carinhosamente de Porcaria. Mas era Porcaria em um tom tão afetuoso que ela atendia cheia de graça. O som do elevador a deixa alerta, mas a porta não se abre com ele.
Na casa nova que já é velha conhecida de minha flor, frequentada desde a mais tenra idade, onde ela passou seu primeiro Natal no Rio, em 2003 – tinha um ano e meio e pelo completamente avermelhado, nada desses pelos brancos que se espalham por seu corpinho – pois bem, nessa casa que agora é também seu lar, ela não para quieta. Vai de um lado a outro, seguindo rastros, checando quem chega e quem sai, franzindo o focinho ao menor sinal de invasão, é um cão de guarda! Tanto caminha, tanto anda, tanto presta atenção que perdeu duzentos gramas em sessenta dias e quando chega a noite fica assim, como na foto: derrubada. Ela que vira – sempre! – o focinho quando me aproximo para tirar foto, nem se mexe. Está exausta, louca por um escurinho do cinema e o aconchego de um de nós.
Shee arrumou amigos na vizinhança: Thor, Nick e outros dois que ainda não sei o nome. Eles fazem a maior festa quando a encontram e ela bem gosta do assédio, apesar de fazer cara de paisagem. Quando saímos e não encontramos ninguém, ela fica como numa partida entre Nadal e Federer, olhando de um lado a outro, sem confessar para quem torce. Mas não sei o que lhe deu, que resolveu latir ferozmente para labradores. Quanto maior, mais alto o latido. Temos que mudar de calçada ou encurtar o passeio. Não fazia isso antigamente, é briga nova. Enfim, minha flor já dorme e ronca, daqui a pouco levantará a cabeça para saber se continuo batucando teclas na madrugada.